Ela me disse. Fria, seca, apenas
disse. Com aquele sorriso que me faria levantar da cama às 3 da manhã, e me
fez.
- Ligue pra sua namorada. Está na hora de
vocês terem aquela conversa. - Ela falou deitada na cama, enquanto acendia um
cigarro, e cobria seu corpo com um fino lençol, me olhando como expectador
daquela cena. - Apenas diga seus motivos, e diga que não foi culpa dela. Mas
que você encontrou outra pessoa.
Como eu poderia ter encontrado
outra pessoa, se eu nem estava procurando?
- Diga pra ela não ficar triste, chateada ou
revoltada. Mesmo que você saiba que é inevitável. Ela ficará brava, destruída,
deprimida... e você dirá que sua intenção nunca foi magoá-la. E que o coração
dela só estará curado, quando ela aprender a amar novamente, e não esqueça de
dizer, que isso pode não fazer sentido agora, mas que vocês ainda serão amigos.
E então você a solta nesse abismo do nada, delicadamente, pelas pontas dos
dedos. Não diga a ela que eu te dou algo, que você nem sabia que sentia falta.
Nem tente explicar, o quão diferente é quando nós nos beijamos. E diga mais uma
vez, apenas para reforçar, que o coração dela só estará curado, quando ela amar
novamente. Ligue pra sua namorada, é hora de vocês terem essa conversa.
Ela falou, como quem já havia falado isso muitas e muitas vezes. Como se
fosse experiente em fins de relacionamentos, e com um tom de quem sabe tanto o
que faz, quanto um professor de matemática pós-graduado em alguma universidade
de ponta, ensinando a um aluno, uma conta de subtrair. O que já era de se
esperar, uma mulher como ela, com certeza, já esteve muitas vezes ligando, e
tendo tal conversa, e depois acenderia seu cigarro, como fez antes.
Caminharia, naturalmente, como se
deitou naquela cama cinco minutos antes. E continuaria sua vida, em busca de
outros lugares a visitar, onde espalharia suas frases contra intelectualóides
superficiais, exalando aquele ar blasé, e no fim de tudo, se mostraria alguém
de alma rasa, que está sempre a procura de outro alguém - quem quer que fosse
- para conquistar, e ligar pra ter tal
conversa.
Aquela conversa que destruiria o
dia, a semana, o mês e até um ano de alguém, mas que pra ela, seria normal.
Rotineiro.
Tomaria uma cerveja, um conhaque,
um café, que fosse. E engoliria junto com o líquido toda mágoa que restou. Como
se fosse professora: de finais.
- Você já falou isso muitas
vezes?
- Nunca. Mas já ouvi o
suficiente.